É uma afirmação básica, direta, quase simplória, de tão óbvia que é:
Retiram-se desta afirmação alguns corolários importantes, que deviam ser considerados no desenvolvimento de qualquer projeto.
Corolário 1: Gerir o custo passa por gerir o que as coisas são.
Se o preço das coisas depende do que elas são, então gerir o custo passa por gerir o que as coisas são.
Gerir o custo de um projeto com vista a atingir um objetivo não pode ser feito a gritar para o Excel, a forçar e reforçar contratos de empreitada, a proibir que o custe varie.
Se o preço das coisas depende do que elas são, então gerir o custo passa por trabalhar muito bem ao nível da definição das coisas. Queremos isto ou aquilo? O material é este ou outro? Que soluções estamos a adotar? Etc.
É também fundamental estarmos muito cientes de que coisas estamos a falar quando falamos de custo. Antes de definir um objetivo para o custo do projeto temos de estabelecer quais são as coisas que o projeto tem de pagar. Antes de interpretar uma estimativa, temos de perceber qual o objeto cujo custo está a ser estimado.
Corolário 2: É na fase de conceção que se gasta o dinheiro!
Se o preço das coisas depende do que elas são, e as coisas são definidas na fase de conceção, então o preço é definido na fase de conceção.
É à fase de conceção que temos de dar atenção. É aí que se gasta o dinheiro. É aí que se define o produto – o que as coisas são – que vamos pagar mais tarde.
Não serve de nada desenvolver um projeto alheio ao custo e achar que na contratação e negociação da obra conseguiremos gerir o valor desta.
É na fase de conceção que se gasta o dinheiro!
Corolário 3: Não faz sentido pedir propostas de preço para coisas que não estão definidas.
Se o preço das coisas depende do que elas são, não faz sentido pedir propostas de preço para coisas que não estão definidas.
Não faz sentido pedir propostas de empreitada de valor fechado quando o produto não está definido.
Não faz sentido pedir propostas de “preço máximo garantido” quando o objeto não está definido e o empreiteiro não controla a sua definição.
Não faz sentido pedir um preço para uma porta sequer, se não sabemos de que porta estamos a falar.
Não faz sentido pedir propostas com base num estudo prévio a achar que vai ser uma proposta fiável, fechada e minimamente concorrencial.
Algumas considerações adicionais:
Então e a fase de contratação?
Mas não é na contratação da obra que se define verdadeiramente o preço? E então a importância da contratação e negociação?
Sem dúvida que o processo de contratação é importante, mas a variação de preço nesta fase é de +/- 5%.
Se algo vai custar 100 ou 200 ou 300 é definido no desenho, a contratação apenas nos dirá se vai custar 98 ou 100 ou 102.
É preciso mudar a forma como a indústria trabalha
A indústria trabalha como se o preço não dependesse do que as coisas são.
Dá-se uma atenção desmesurada à contratação e negociação da obra, pois aí aparecem as propostas com números explícitos e elevados. Dá-se uma atenção desmesurada à gestão do custo na fase de obra – os trabalhos a mais, o value engineering, as otimizações e discussões.
Dá-se uma atenção muito reduzida ao dinheiro na fase de conceção, tanto pelos projetistas como pelo dono de obra.
Não conseguimos sobrestimar a força desta afirmação: é na fase de conceção que se gasta o dinheiro!
Conclusão
O preço das coisas depende do que elas são.
É na fase de conceção que se gasta o dinheiro, e temos de atuar em conformidade.
Não vale a pena gerir o custo apenas do lado do Excel e do contrato, tentando fixar números por decreto quando há indefinição ou volatilidade na definição do que as coisas são.
Ilustração de Ana Salvado | Todos os direitos reservados