Lições do xadrez posicional

Lições do xadrez posicional

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Este post é o seguimento de Sobre a estratégia no xadrez.

Decidir é difícil. Grande parte das decisões com que nos deparamos, exceptuando talvez as decisões triviais do quotidiano,  envolvem inúmeras variáveis, com uma infinidade de ramificações ao longo do tempo e pelas mais diversas áreas da nossa vida. O resultado das nossas decisões depende das decisões dos outros, do contexto que nos envolve, do caos – prever é impossível.

Fazer previsões é extremamente difícil, especialmente se for sobre o futuro.

Neils Bohr (origem não comprovada)

Ora se é impossível prever o resultado das nossas decisões, como podemos decidir?!

Uma decisão, por oposição a um ato aleatório, é uma atitude consciente e intencional:

  1. Decidimos fazer A porque A nos parece melhor do que B;
  2. Porque é que A nos parece melhor do que B? Porque o resultado de A nos parece melhor do que o de B;
  3. E como é que eu sei qual o resultado de A e de B se não os consigo prever? Pois…

E é aqui que entra o Xadrez Posicional.

Não pretendo que seja uma panaceia milagrosa que resolve todas as decisões problemáticas, apenas defendo que se trata de um modelo de análise extremamente proveitoso para a tomada de decisões complexas, especialmente quando estas têm um alcance temporal alargado e muita incerteza associada.

Mais do que analisar o resultado concreto da decisão, analisamos a posição em que esta nos deixa.

E como avaliamos essa posição? O que é uma posição vantajosa? Como sei que uma determinada posição é melhor do que outra?

A resposta não é clara mas, se pensarmos com cuidado, rapidamente se destacam alguns fatores relevantes:

Opções

Ter opções, mantendo de resto tudo igual, é sempre mais vantajoso que não as ter. Uma decisão que nos dê opções poderá ser mais vantajosa do que uma que feche opções.

Competências e aprendizagem

As competências pessoais são um ativo crítico nos dias de hoje. O que sabemos, o que sabemos fazer, o que sabemos aprender, a que recursos conseguimos aceder, etc.

Uma posição em que nós tenhamos mais competências pessoais é quase sempre mais valiosa do que uma em que tenhamos menos.

Adequabilidade dos recursos

Uma posição em que as nossas competências ou recursos sejam mais valiosos será melhor do que uma posição em que não sejam tão valiosos. Se eu sou bom a conduzir carro, então um caminho que envolva condução poderá ser um bom caminho. Por outro lado, se eu nem carta tenho, este caminho será terrível.

Contatos e relacionamentos

A nossa rede de contatos e relacionamentos é um bem valioso. Não defendo que se deva fazer uma gestão do networking como quem gere o stock de uma coisa qualquer, não subscrevo a colecção de contatos como quem coleciona cromos ou porta-chaves. Mas sei que, tanto do ponto de vista pessoal como profissional, é importante mantermos boas relações, estabelecermos contatos, conhecermos pessoas e tudo o mais. Assim, um dos fatores de avaliação da posição resultante de uma determinada decisão será sem dúvida a questão dos contatos: se for por aqui vou conhecer outras pessoas e estabelecer novos contatos?

Crescimento pessoal

Esta é mais vaga, mas não menos importante.

Estabelecer contacto com novas culturas, pessoas, áreas de atividade e coisas novas é algo que nos valoriza muito. Alargar os horizontes, ver outras coisas e conhecer outras realidades; não me refiro agora a contatos como no ponto anterior, falo sim de crescimento pessoal. Não tenho muitas dúvidas que tomar uma decisão que conduza a um alargar dos nossos horizontes e a sairmos da nossa “caixa”, da nossa zona de conforto, terá um impacto positivo na nossa posição resultante.

Do ponto de vista pessoal e profissional, estaremos melhor se conhecermos outras coisas e tivermos olhado para lá do perímetro restrito do meio onde habitualmente nos movimentamos.

Oportunidades

Esta é potente! Mais do que avaliar o resultado concreto de uma decisão, ganhamos em avaliar as oportunidades que esta nos pode revelar.

Há caminhos que optamos por seguir que estão claramente pejados de oportunidades, outros há em que estas são mais escassas. Não sabemos à partida que oportunidades serão estas, nem se as vamos conseguir ou querer desenvolver. Mas sem dúvida que estar numa posição em que se nos apresentam oportunidades é muito mais vantajoso do que estar numa posição em que tal não acontece.


Poderia continuar aqui a escrever sobre aspectos que interessam na análise da posição resultante de uma determinada decisão.

Mas o ponto que quero passar é que é quase sempre mais proveitosa a análise de uma decisão enquanto algo incremental – um próximo passo num caminho que estamos a seguir, e que vai dar origem a mais decisões – do que a análise enquanto algo último e definitivo, em que tudo está em jogo e, como tal, implica a consideração de todos os fatores envolvidos e cenários possíveis.

Jaime Quintas

Ilustração de Ana Salvado | Todos os direitos reservados

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